As Nações Unidas lançaram em 2002, há exatos 20 anos, a Life Cycle Initiative, com o objetivo de reforçar a importância de se pensar impactos de qualquer atividade, de qualquer decisão, de forma integrada, considerando todos os elos da cadeia, e todas as categorias, em conjunto. Assim, além de identificar melhorias de processo, evitaríamos a (mera) transferência de problemas entre atores.
A Rio+20, em 2012, veio corroborar esta orientação, com vários manifestos internacionais, inclusive o próprio documento “O Futuro que Queremos”, a Visão 2050 do WBCSD, um posicionamento da Rede Brasil do Pacto Global, entre outros.
Outros dez anos mais tarde, reconhecemos que a gestão orientada ao Ciclo de Vida requer ações continuadas. A Rede Empresarial Brasileira de Avaliação de Ciclo de Vida (Rede ACV) decidiu desenvolver Assessment de Maturidade em ACV para apoiar seus associados nesta caminhada.
O objetivo do Assessment é oferecer um Diagnóstico estratégico da orientação ao Pensamento de Ciclo de Vida (PCV), por meio de um questionário automatizado, que posicionará a maturidade da companhia em relação aos desafios. Em seguida, um conjunto de possíveis ações indicará potenciais avanços na maturidade.
O Diagnóstico servirá de ponto de partida (= fotografia), para Plano de Ação (= filme).
Conhecimento acumulado é a base para o Assessment de Maturidade em ACV
Após a Rio+20 ficou evidente a necessidade de criar-se ambiente empresarial, no qual organizações poderiam compartilhar sua experiência concreta com a adoção do Pensamento de Ciclo de Vida e da Avaliação de Ciclo de vida na gestão.
A Rede ACV foi lançada em 2013 com a Missão de mobilizar as empresas, articular governos e educar o consumidor visando incorporar o Pensamento de Ciclo de Vida (PCV) como conceito e a Avaliação de Ciclo de Vida (ACV) como ferramenta para determinar a sustentabilidade dos produtos. Para isso, ela visa criar um ambiente de cooperação para o uso de ACV no Brasil; educar e capacitar a sociedade sobre este conceito, sua aplicação e benefícios; disponibilizar e disseminar para diversos públicos informações sobre ACV no Brasil e colaborar e apoiar o governo brasileiro na consolidação do Banco Nacional de Inventários do Ciclo de Vida.
A ACV é, antes de tudo, uma forma sistêmica e holística de pensar e, portanto, gerenciar impactos. Ela nos orienta a considerarmos várias dimensões e vários elos da cadeia produtiva, refletindo a complexidade na qual todos estão inseridos. Além de contribuir com mensuração concreta, que possibilita uma análise objetiva da situação e dos cenários de aprimoramento de determinado aspecto, ela torna o processo transparente, possibilitando uma interação entre áreas da empresa, sua cadeia de fornecedores e seus clientes, aproximando todos os atores no objetivo comum de promover a sustentabilidade.
Em suas reuniões bimestrais, a Rede ACV promove debate sobre Tema Especial que tenha o potencial de alavancar a adoção do Pensamento de Ciclo de Vida, e da ACV, na tomada de decisão.
Já foi explorada a complementariedade entre Economia Circular e ACV, com desdobramentos concretos em segmentos (Construção, Eletroeletrônicos e Moda), a frequente referência ao PCV e à ACV em Políticas Públicas (Política Nacional de Resíduos Sólidos, nova Lei de Licitações, RenovaBio) e em ambientes de gestão.
O PCV e a ACV no questionário ISE/B3
Por: Laís Rosado, da ACV Brasil
O Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE B3) é uma ferramenta para análise comparativa da performance das empresas listadas na bolsa de valores sob o aspecto da sustentabilidade corporativa. A seleção das empresas cujos papéis integrarão a carteira do ISE B3 é realizada anualmente por meio de um processo público, que tem como um de seus elementos fundamentais o Questionário ISE B3.
O questionário mais recente, que elegeu a carteira 2022, possui cinco dimensões (Capital humano, Governança corporativa, Modelo de negócio e inovação, Capital social e Meio Ambiente), subdivididas em 28 temas. Uma sexta dimensão, referente às Mudanças Climáticas, é avaliada por meio do score CDP – Climate Change.
A ferramenta é revisada periodicamente e sempre contemplou questões relacionadas com o PCV, a ACV e Inventários de Emissões de GEE. No entanto, o atual questionário traz um destaque ainda maior para o PCV e a ACV, no tema específico “Design do produto e gestão do ciclo de vida” da dimensão Modelo de negócio e inovação.
Este tema específico aborda a capacidade da empresa em incorporar considerações sociais e ambientais nas características dos produtos e serviços por ela fornecidos e comercializados. As questões incluem, entre outros aspectos, o gerenciamento dos impactos do ciclo de vida destes produtos e serviços. Tais como aqueles relacionados à embalagem, distribuição, intensidade de recursos e externalidades na fase de utilização e fim de vida útil.
As respostas das companhias participantes do processo de seleção da carteira de 2022 estão disponíveis para consulta, ao todo são 129 respostas publicadas. Analisamos as respostas de duas questões que possuem importante relação com o PCV e a ACV.
A primeira questão avaliada, “Como a companhia avalia seu desempenho ambiental?”, demonstrou que a maioria das companhias participantes da carteira 2022, avalia seu desempenho ambiental de forma sistemática, considerando, em todas as situações, a perspectiva do ciclo de vida de seus produtos ou serviços. Por outro lado, as respostas das companhias não selecionadas para a carteira, declaram que não consideram o ciclo de vida de seus produtos ou serviços como referência de avaliação e monitoramento ou consideram o ciclo de vida de seus produtos ou serviços em casos específicos ou em caráter piloto.
A segunda questão avaliada “Indique como a companhia busca adotar mecanismos de gestão do ciclo de vida de seus produtos e/ou serviços”, indicou que, de modo geral, as respostas das companhias eleitas para a carteira 2022 demonstram maior maturidade na adoção de mecanismos de gestão do ciclo de vida. Nota-se que 69% das companhias eleitas adotam indicadores para medir os impactos sociais e ambientais do uso dos seus produtos/serviços e 42% realiza regularmente a revisão e eventuais aperfeiçoamentos de produtos/serviços, com base nos resultados da análise de seu ciclo de vida. Enquanto que, as companhias não eleitas alcançaram 27% e 20%, respectivamente.
A cada processo de seleção da carteira ISE B3, o PCV e a ACV alcançam maior representatividade,confirmando a importante correlação destes temas com a missão desta ferramenta, a qual visa “apoiar os investidores na tomada de decisão de investimentos socialmente responsáveis e induzir as empresas a adotarem as melhores práticas de sustentabilidade empresarial”.
O Pensamento de Ciclo de Vida na visão da ISO 14001
Por Mayara Zunckeller, Gerente de Operações na TÜV Rheinland Brasil
É visível que há uma nova demanda por práticas ESG (Environmental, Social and Governance) e, nesse cenário, a ISO 14001 está ganhando força e sendo objeto de interesse de empresas dos mais diversos setores. A Norma especifica os requisitos para um sistema de gestão ambiental que uma organização pode usar para aumentar seu desempenho ambiental, e destina-se a organizações que buscam gerenciar suas responsabilidades ambientais de forma sistemática, contribuindo para o pilar ambiental da sustentabilidade.
De acordo com a versão 2015 da ISO 14001: “A Organização deve considerar a perspectiva de ciclo de vida quando determinar os aspectos ambientais.” Ou seja, dentro do escopo definido no sistema de gestão ambiental, a organização deve determinar os aspectos ambientais de suas atividades, produtos e serviços os quais ela possa controlar e aqueles que ela possa influenciar, e seus impactos ambientais associados, considerando uma perspectiva de ciclo de vida.
Isso não exige, necessariamente, uma avaliação detalhada de ciclo de vida; mas sim um pensamento cuidadoso sobre os estágios do ciclo de vida que podem ser controlados ou influenciados pela organização. Estes estágios podem ser controlados ou influenciados pela organização e dependerão muito do porte da empresa.
Espera-se de uma organização global de grande porte uma análise mais detalhada e documentada, enquanto que de uma pequena empresa local de serviços, um estudo muito mais reduzido. No entanto, em ambos os casos é necessária a documentação das informações relativas aos aspectos ambientais apontados e os critérios que determinaram sua relevância.
Em outras palavras, isso significa que os aspectos relativos a todo o ciclo de vida de um produto ou serviço deverá estar documentado até determinado nível de detalhamento, ainda que o Sistema de Gestão Ambiental irá atuar/considerar apenas aqueles considerados relevantes, após a análise. Às vezes, alguns estágios do ciclo de vida simplesmente não são aplicáveis ou, ao menos, não são tão relevantes; em outros casos, de fato não há possibilidade de a Organização controlar ou influenciar. No entanto, há que se diferenciar “ausência de controle” e “ausência de influência”.
O PCV e a ACV no questionário do Sistema B
Por: Luiz Carlos Bertoncello e Aline Galvão, da ReUrbi
O Sistema B Brasil é uma organização parceira do B Lab desde 2012, responsável pelo engajamento, divulgação e promoção local de todo movimento B em todo país e na América Latina.
O Movimento Global de Empresas B foi criado em 2006 nos Estados Unidos com objetivo de redefinir sucesso na economia para que sejam considerados não apenas o êxito financeiro, como também o bem-estar da sociedade e do planeta.Esta é uma comunidade global de líderes que usam os seus negócios para a construção de um sistema econômico mais inclusivo, equitativo e regenerativo para as pessoas e para o planeta.Conta hoje com 5.370 Empresas B Certificadas, sendo 900 na América Latina e 253 no Brasil.
Devemos considerar inicialmente que esta não é necessariamente a posição do Sistema B Brasil e do B Lab, que é o responsável pela gestão e divulgação do B Impact Assessment – BIA – junto às empresas B, e que tem como fundamento os pontos elencados a seguir, mas sim, a visão de uma Empresa B Certificada que utiliza essa ferramenta em sua avaliação dentro do Sistema. Dessa forma, buscamos estabelecer uma análise comparativa e complementar dos dois instrumentos de medição.
Utilizada por mais de 150.000 empresas, a Avaliação é uma ferramenta digital gratuita que pode auxiliar a medir, gerir e melhorar o desempenho de impacto positivo para o ambiente, comunidades, clientes, fornecedores, colaboradores e acionistas.
Esta é utilizada também pelo Sistema B como primeiro passo para a Certificação de uma Empresa no Movimento, quando atingida a pontuação mínima verificada.
Nesta ferramenta, respondendo a perguntas sobre padrões de impacto abrangentes, medindo e gerenciando o impacto socioambiental da sua empresa, é possível estabelecer objetivos de melhoria contínua em seu processo e impacto, aprendendo com práticas recomendadas confiáveis, podendo ainda comparar o desempenho com o de outras do setor.
Para avaliar seu impacto, você responderá a uma série de perguntas sobre as práticas e resultados da sua empresa em cinco categorias: governança, trabalhadores, comunidade, meio ambiente e clientes.
Exemplos de perguntas:
- Governança: O que sua empresa pode fazer para melhorar as políticas e práticas relacionadas à sua missão, ética, responsabilidade corporativa e transparência?
- Trabalhadores: O que sua empresa pode fazer para contribuir para o bem-estar financeiro, físico, profissional e social de seus funcionários?
- Comunidade: Qual porcentagem da gestão provém de populações sub-representadas? O que sua empresa pode fazer para melhorar sua gestão como um todo?
- Meio Ambiente: A sua empresa controla e regista a sua produção universal de resíduos? É feita a mensuração de Inventário de Emissão de GEE? O que sua empresa pode fazer para aumentar o valor gerado para seus clientes diretos e para os consumidores e usuários de seus produtos ou serviços?
- Clientes: Como verificar que o seu produto melhora o impacto dos seus clientes? O que sua empresa pode fazer para contribuir para o bem-estar socioeconômico das comunidades em que opera?
A ferramenta usa uma metodologia internacional, difundida e reconhecida em diversos países, suas normas são criadas e revisadas pelo Conselho Consultivo de Normas (Standards Advisory Council, SAC), um grupo de especialistas independentes em negócios e academia.
Permite uma divulgação honesta e transparente de resultados e pontos a melhorar, entendendo que o impacto positivo é um trabalho de melhoria contínua. Avalia a estrutura da empresa como um todo e não somente um produto ou serviço.
É neste ponto que podemos inferir os pontos essenciais de cada instrumento.
O BIA avalia a empresa como um todo ao passo que o foco do PCV traz uma complementariedade para a visão também do produto e da avaliação do ciclo de vida. Podemos, pois, considerar que o BIA poderia estar englobado no amplo aspecto da Governança que propõe o Assessment de Maturidade em ACV.
Além de acompanharem a sua própria evolução, no tempo, também comparados ao universo respondente, o Assessment de Maturidade em ACV pretende apoiar seus associados na pontuação em questionários de mercado que reconhecem o valor do PCV na gestão.
A construção do Assessmentde Maturidade em ACV
Por: Larissa Landete Cipriano e Rebeca Venâncio, da Fundação Espaço ECO
Após detalhada pesquisa e análise de fontes de orientação ao Pensamento de Ciclo de Vida foi iniciada a construção de perguntas e respostas, que indicarão a maturidade das organizações respondentes em ACV.
As perguntas foram divididas em três temáticas: Gestão, Produto e Avaliação do Ciclo de Vida. “Gestão” possui perguntas relacionadas à atuação em sustentabilidade da organização em suas operações, incluindo gestão de temas estratégicos e suas devidas metas. Em “Produto”, o questionário aborda questões relacionadas com a estratégia de sustentabilidade dos produtos da organização, desde a relação de desenvolvimento até os possíveis impactos. Em “Avaliação de Ciclo de Vida”, é analisada a adoção do Pensamento de Ciclo de Vida, a usabilidade dos estudos de Avaliação do Ciclo de Vida nos produtos e o compromisso em relação à Gestão do Ciclo de Vida. Em todas, o respondente tem graduações de múltipla escolha, para indicar a que mais corresponde à atuação da organização que representa.
Para o Assessment de Maturidade em ACV foram consideradas quatro graduações, bastante alinhadas à metodologia proposta pela Life Cycle Initiative, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUD, em inglês), adaptadas à realidade concreta de empresas:
Perfil A: integram a Gestão do Ciclo de Vida às metas da organização, considerando as expectativas dos stakeholders e a necessidade do mercado, apresentando uma gestão integrada e adaptativa à necessidade e mudança do mercado.
Perfil B: utilizam a Avaliação do Ciclo de Vida como ferramenta de mensuração de impacto ambiental, integrando a cadeia de valor e como referência para melhorar o desempenho operacional e de produtos, estabelecendo metas e objetivos.
Perfil C: usam a Avaliação do Ciclo de Vida para compreender as entradas e saídas do sistema produtivo e como base para estabelecer uma estratégia para melhor utilização dos recursos e atingimento de metas da companhia, considerando critérios ambientais e econômicos.
Perfil D: utilizam a Avaliação do Ciclo de Vida para análise de projetos pontuais, sendo visível para os responsáveis pela implementação.
Status e próximos passos
A usabilidade do Diagnóstico foi testada e o questionário seguirá para a fase de programação, ficando disponível no site da Rede ACV, para o público em geral.
O Plano de Ação começará a ser desenhado, considerando as próprias graduações das respostas e a natureza colaborativa da Rede Empresarial Brasileira de Avaliação de Ciclo de Vida. Ele será a base para toda a gestão de expectativas de associados e o avanço em Maturidade, no tempo, demonstrará a contribuição concreta da Rede ACV no alcance de sua Missão.
“Este trabalho em equipe, da Rede ACV, seus associados e a execução da Fundação Espaço ECO, foi essencial para que a ferramenta de Diagnóstico pudesse refletir a realidade dentro das organizações e assim, possibilitar a elaboração de Plano de Ação para as companhias estabelecerem também sua estratégia em sustentabilidade dentro da metodologia de Pensamento de Ciclo de Vida”, explica Taíse Beduschi, presidente do Conselho Deliberativo da Rede ACV, gerente de Sustentabilidade do Grupo Malwee.
Mais informações:
Sonia Karin Chapman – Secretária Executiva da Rede ACV
Contato: secretaria@redeacv.org.br
Site da Rede ACV: https://redeacv.org.br/pt-br
Perfil no LinkedIn da Rede ACV: https://www.linkedin.com/company/redeacv/