Documento inédito também mostra que houve acréscimo de 14,6% na quantidade de resíduos de saúde gerados em decorrência da Covid-19
Durante o período da pandemia da COVID-19 (2020/2021), a geração de resíduos sólidos urbanos (RSU) nos domicílios brasileiros cresceu cerca de 4%, com uma média de 1,07 kg/hab/dia. Com a migração das atividades sociais, de trabalho e educação para dentro das residências, a geração de RSU no país alcançou a marca de 82,5 milhões ton/ano, de acordo com os dados inéditos do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2021, publicação de referência lançada pela ABRELPE – Associação Brasileiras das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais, que nesta edição traz indicadores exclusivos e atualizados sobre a geração, coleta e destinação dos resíduos sob influência da pandemia da Covid-19.
O aumento expressivo na geração de resíduos está bem acima do crescimento anual médio de 1% verificado nos últimos 5 anos e está relacionado às novas dinâmicas sociais, que se concentraram quase que totalmente nas residências, com a substituição do consumo em restaurantes por deliveries e os demais descartes diários de resíduos ocorrendo dentro dos lares.
“Antes do período da pandemia, a geração de resíduos acontecia de maneira descentralizada nas diferentes regiões das cidades, uma vez que as atividades diárias eram desempenhadas em diferentes locais (escritórios, escolas, centros comerciais etc), servidos por diferentes estruturas de manejo de resíduos sólidos. Com a maior concentração das pessoas em suas residências, observou-se uma concentração da geração de resíduos nesses locais, atendidos diretamente pelos serviços de limpeza urbana”, observa Carlos Silva Filho, diretor presidente da ABRELPE e presidente da ISWA (International Solid Waste Association).
No âmbito regional, o Sudeste responde por quase 50% do total de resíduos gerados no país, com um índice de 1,261 kg/hab/dia, enquanto que a região Norte representa aproximadamente 7,4% do total, com um indicador de 0,898 kg/hab/dia.
O levantamento mostra que, mesmo com um crescimento quantitativo observado na coleta, a cobertura do serviço não foi ampliada. O Panorama aponta que foram coletados 76,1 milhões de ton/ano de RSU (cobertura de 92,2%), o que significa que 6,4 milhões de ton/ano de resíduos sequer foram retirados dos pontos de geração, volume que poderiam encher 3 mil piscinas olímpicas.
“Ainda temos um contingente considerável de pessoas – cerca de 16,5 milhões de pessoas – que não tem coleta regular de lixo na porta de casa, ou seja, 1 em cada 12 brasileiros não conta com esse serviço básico e essencial”, diz Silva Filho.
A publicação evidencia que apenas as regiões Sudeste (98,2%), Sul (95,7%) e Centro-Oeste (93,9%) já alcançaram índice de cobertura de coleta superior à média nacional. As regiões Norte (81,4%) e Nordeste (81,5%) deixam de coletar cerca de 20% dos resíduos gerados nos municípios localizados nessas regiões
No tocante ao destino dos resíduos, o documento destaca que pela primeira vez a destinação final ambientalmente adequada de resíduos supera a casa dos 60%, com cerca de 46 milhões de toneladas sendo depositadas em aterros sanitários, os quais são obras de engenharia licenciadas para tal finalidade. Isso demonstra a consolidação de uma tendência de evolução para um problema ainda presente no País, que é a destinação inadequada de resíduos para aterros controlados e lixões a céu aberto, responsáveis por ainda receber quase 40% do total de resíduos coletados, ou 30,3 milhões de toneladas por ano, que daria para encher 765 estádios do Maracanã, e afetam a saúde de 77,5 milhões de pessoas.
Os índices verificados nas regiões Sudeste e Sul, ambas com mais de 70% dos resíduos sendo encaminhados para destinação adequada, demonstram que é possível avançar de maneira consistente para o encerramento das práticas de destinação inadequadas. “Com a evolução observada no último período, temos que praticamente metade das cidades brasileiras já dispõem os resíduos coletados em locais adequados, porém, vale destacar que o ritmo verificado ainda está muito lento e dessa forma provavelmente o país não vai conseguir cumprir o prazo de extinguir os lixões até 2024”, comenta o diretor presidente da ABRELPE.
O Panorama ainda aponta que a carência de recursos para custear as operações do setor afeta diretamente a execução, ampliação e modernização dos serviços. Os recursos aplicados pelos municípios para a execução dos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos – como coleta, transporte, destinação, varrição de ruas, limpeza de feiras, manutenção de parques, praças e jardins, dentre outros serviços – foram de R$ 10,75 hab/mês.
“Se os recursos destinados para a gestão e manejo de resíduos já eram insuficientes, com o aumento dos serviços, da mão de obrae demais custos durante a pandemia, os orçamentos municipais ficaram ainda mais sobrecarregados, pois tiveram que absorver uma conta por um volume de resíduos que antes era das empresas, centros educacionais, dos grandes geradores e, durante este período, migrou para o orçamento público, o que demonstra a extrema relevância das disposições do novo marco legal do saneamento básico que impõem a obrigação para custeio de tais serviços mediante remuneração com cobrança dos usuários”, analisa o diretor presidente da ABRELPE.
Resíduos de saúde crescem 14,6%
O aumento no número de internações hospitalares, atendimentos de saúde e programas de vacinação por conta da pandemia da Covid-19 impactou a geração de resíduos de saúde, que registrou crescimento de 14,6% e produção média de lixo hospitalar por pessoa de 1,369 kg/hab/ano. De acordo com o Panorama dos Resíduos Sólidos 2021, cerca de 290 mil toneladas de resíduos de serviços de saúde foram coletadas nos municípios em 2020.
Mesmo com esse acréscimo de 37 mil toneladas de resíduos de saúde decorrentes do processo de atendimento aos pacientes da Covid-19, cerca de 30% dos resíduos coletados ainda seguem para unidades de disposição final sem nenhum tratamento prévio, o que contraria as normas vigentes e apresenta riscos diretos aos trabalhadores, à saúde pública e ao meio ambiente.
“Desde o início da pandemia as autoridades sanitárias do país e do exterior têm alertado sobre o potencial infectante dos resíduos hospitalares gerados durante a COVID-19, exigindo que os materiais, em sua totalidade, tenham um gerenciamento específico e aqueles com potencial infectaste ou com algum grau de periculosidade sejam submetidos a processos de tratamento que neutralizem a carga viral”, ressalta Carlos Silva Filho.
Os dados apresentados no Panorama dos Resíduos Sólidos 2021 demonstra que o país ainda permanece com um sistema linear de gestão de resíduos sólidos urbanos, apesar da vigência de uma Política Nacional de Resíduos Sólidos desde 2010. “O desenvolvimento de um planejamento estratégico consistente para a retomada da COVID19 representa uma importante oportunidade para que governos de todos os níveis estabeleçam as bases e os recursos necessários para criar sistemas de gestão de resíduos de forma integrada, sustentáveis e resilientes”, conclui Silva Filho.
Veja esta edição acessando: https://abrelpe.org.br/panorama/